sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

O poema.

Longe do estéril turbilhão da rua, o poeta escreve. Não são poemas para Lili, são poemas para si, sequer são poemas dadaístas, o poeta não tem um jornal consigo, tampouco uma tesoura.
Fingido, continua a escrever. Às vezes sobre um fogo que arde sem se ver, mas que não é imortal. Às vezes escreve sobre seu povo, seja de uma maneira desvairada, ou por meio de uma mensagem.
No claustro, o poeta prossegue. Não procura a grandeza em sua poesia, apenas a integridade, visto aquela outra é consequência da última. Mede bem as palavras, pois cada uma delas é uma chave, que abre um mundo de possibilidades.
Como um guardador de rebanhos, junta suas ideias. Escreve cantigas trovadoras, cria diversos sonetos clássicos, contradiz com tendências barrocas, enche-se de bucolismo com poemas arcádes, revela-se no sentimentalismo em obras românticas, analisa e pensa no povo em sua poesia realista-naturalista, não se esquece da estética em novos sonetos, dessa vez parnasianos, rende-se ao esoterismo e transcende em seu simbolismo. Chega, por fim, ao modernismo, que é um pouco de tudo que já fomos, ao mesmo tempo que se desprende retoma o passado. Ao mesmo tempo que é claro é escuro, e nunca é apenas isso ou aquilo. O poeta pode ser tudo. O poema já o é.

O poema.

Havia um garoto que gostava muito, muito de uma menina. E ele queria expressar isso que sentia para ela. "Farei um poema" pensou ele, "não será nenhum problema.".
Com a caneta e papel na mão, percebeu que não seria tão fácil. Resolveu começar pelo sorriso dela, um sorriso que ele adorava, que o fazia querer sorrir junto. Um sorriso que alegrava seu dia, até quando ele não queria. Aquele sorriso tão doce e cativante. Sorriso esse que o rapaz só conseguiu definir como "simpático" e a melhor rima encontrada fora "estático".
Continuando sua poesia, escolheu falar sobre seus olhos. Olhos decididos, que lhe davam coragem. Seu olhar era lindo e o fazia sonhar. Aqueles olhos, aqueles olhos que ele podia olhar noite e dia, e ver os seus próprios refletidos naquela imensidão que o consumia. Os olhos, olhos "muito bonitos" segundo ele, que conseguiu rimar de alguma forma com "infinito".
E por aí foi, seus "cabelos brilhantes" rimando obviamente com "diamantes". Seu "beijo quente" que conseguiu rimar com "semente" e rimas e mais rimas que não faziam muito sentido, pelo menos não fora do coração do jovem.
No final ainda conseguiu rimar o nome da moça com "malha", mas nada que pudesse nos surpreender mais, a essa altura.
"A poesia não ficou muito boa..." ele disse receoso, enquanto entregava a ela, "afinal nem todo mundo é Fernando Pessoa.". E ela, lisonjeada, leu com calma e graça. O poema realmente não era dos melhores ou mais sentimentais, tinha construções confusas e talvez rimas demais. Ela notou isso, mas também notou algo diferente. "Eu adorei" ela disse sorridente, "o poema pode não ser perfeito" continuou, "e as rimas não são um primor. Porém ele é maravilhoso, pois saiu do seu peito. Feito com o verdadeiro amor."