domingo, 17 de abril de 2011

O livro.

Minha querida, estou a escrever um livro. A história é simples: um rapaz conhece uma linda garota, eu me apaixono por ti, ela o ama de volta, ama pouco, é verdade, mas ama. Realmente lindo, mas por fim, num final infeliz para ele, você vai embora. Incrivelmente triste, não é?
Ah, decerto que dará um bom livro. Ninguém poderá negar que há-de ser um best-seller, aliás, acredito que foi Henry Miller quem disse que a melhor maneira de se esquecer uma mulher é transformando-a em literatura, e, por deus, como isso está a funcionar. A cada dia misturo-me mais com meu protagonista, - o qual, curiosamente, lembra-me bastante de mim mesmo - e a cada dia apaixono-me mais pela garota por quem ele é apaixonado - a qual, devido a outra ironia do destino, parece-se contigo.
Assim, continuo a escrever sobre esta trágica história de amor onde um lindo amor vivido por um jovem ingénuo e uma jovem idealista morre por culpa dos medos e inseguranças desse rapaz. É uma história simples, não tem muitas coisas que nunca foram vistas na literatura, mas é algo palpável, algo que dois jovens comuns, como nós, por exemplo, poderiam viver.
Assim, continuo a viver, escrevendo e lendo constantemente. Mas não importa quantos romances eu leia ou escreva, para mim nós sempre seremos o melhor livro já escrito.

O livro.

Era um livro comum, mas era o primeiro livro que lera. O primeiro que conseguira ler sozinho. Lembra-se de sair correndo para dizer à sua mãe que leu o livro todo. Ela o parabenizou, ele sorriu. Mal podia dormir, sua mãe disse que estava crescendo, ele não entendia muito bem o que leu, mas entendia que leu, e bastava. Abraçado ao livro, sorrindo, dormiu.
Sonhou um sonho. Era o herói do livro, o príncipe da estória. Socorria a mocinha, vencia o vilão, e ficavam todos os bons felizes.
Acordou, já estava mais velho e ficou surpreso ao ter sonhado com o livro de sua infância. Desde que lera pela primeira vez nunca mais o tocou, e resolveu lê-lo novamente. Ao ler, viu como a estória era infantil e simples, mas a mensagem e o signifcado do livro para ele bastaram, era seu livro predileto, afinal. Sempre carregava consigo, embora nunca mostrasse a ninguém, pelo fato do livro ser de criança.
Era uma garota comum, mas a primeira garota que gostara. A primeira que se apaixonara. Lembra-se de sair correndo para alcançá-la e dizer tudo o que sentia. Ela o beijou, ele sorriu. Mal podia dormir, ele estava crescendo, não entendia muito bem o que sentia, mas estava com ela, e bastava. Lembrou de tudo, do livro, da garota, e sorrindo dormiu.
Sonhou um sonho. Era o herói do livro, o príncipe da estória. Socorria a mocinha, e a mocinha era a garota. Ficavam todos felizes.
Acordou e percebeu que a estória tornou-se história, a história dos dois. Queria escrever um livro. Mas não era capaz, só conseguiu ler a estória do príncipe, que salvava a mocinha e vencia o vilão. Para sua garota, para seus filhos, para todos, sempre contava sua estória e sua história. A do livro. A do coração.