sexta-feira, 27 de maio de 2011

A pequena alcatéia.

Estava frio, em todos os lados via-se a branca neve, mas ela estava maculada, maculada com manchas de sangue. Em meio aos pinheiros vinha uma grande alcateia. Consistia de muitos lobos, lobos fortes, de pelagem escura e completamente maldosos.
Os lobos não confiavam uns nos outros, e tinham motivos para tal. Constantemente haviam traições, a alcateia destruía a si mesma. Os lobos buscavam apenas o poder, sem se importar com as consequências de seus actos em relação aos outros.
Estava frio, em todos os lados via-se a branca neve, mas haviam também lobos. Em meio aos pinheiros vinha uma alcateia comum. Consistia de alguns lobos, lobos fortes e fracos, de pelagem cinza e bons e maus.
Parte deles estava unida, a outra também, mas essas partes brigavam constantemente, causando a discórdia e depois a divisão da alcateia, em alcateias ainda menores.
Estava frio, em todos os lados via-se a branca neve, apenas a neve, haviam pouquíssimos lobos. Em meio aos pinheiros vinha uma pequena alcateia. Consistia de apenas três lobos, não eram tão fortes, tinham a pelagem branca e eram bondosos.
Apesar de não serem tão fortes individualmente e de serem apenas três, eram uma forte alcateia, tudo isso porque era a mais unida das alcateias.
Estava frio, e a pequena alcateia seguiu em frente.

A pequena alcatéia.

Era um homem quieto, que nunca fez mal a ninguém, apesar da aparência crua. Ele era centrado, não falava com quase ninguém, e só se comunicava se tinha alguma dúvida no seu trabalho. Ele era solitário, um lobo solitário.
Todos o viam sozinho, pra lá e pra cá. Sabiam apenas o seu nome, talvez a função que exercia, mas não mais que isso. No elevador, quando tentavam conversar com ele - antes de desistir, há muito tempo - ele respondia com "sim" e "não", sem nem mover os lábios.
Era um dia comum, que não tinha nada de ruim, apesar do clima frio. Até que começou uma cantoria, todos correram para ver o que era, menos o Lobo. Ele não estava interessado.
As pessoas iam voltando, acompanhadas de escoteiros, os escoteiros falavam e cantavam, brincavam e sorriam, estava a divulgar alguma campanha que ninguém lembra bem qual era.
As crianças já estavam preparados para partir até que uma pequena garota percebeu que o nosso Lobo não havia recebido um dos panfletos que distribuíam. Ela foi até ele, puxou-lhe a manga da blusa a fim de chamar sua atenção e entregou o panfleto. Uma colega de trabalho do Solitário disse "como esses escoteiros são bonitinhos, não?" para uma amiga. E, pela primeira vez em tempos o Lobo lhes disse algo que não bom dia: "Na verdade, eles são lobinhos." As duas ficaram tão chocadas pelo fato dele ter falado algo que nem entenderam o que ele dissera. "Lobinhos" ele continuou, "antes de se tornarem escoteiros, eles precisam ser lobinhos..." O Lobo Solitário então contou que fora escoteiro - e, antes disso, lobinho - e começou a falar das histórias de quando ainda era menino, todos se interessaram e se reuniram para ouvi-las, as pessoas de seu trabalho, os escoteiros - que, na verdade eram lobinhos - e descobriram um novo lado do Lobo. Ele cantou com os lobinhos, brincou, sorriu, riu, fez rir. Todos estavam felizes - e muitos surpresos. O Lobo tinha um sorriso belo e parecia ser uma pessoa doce, por trás daquela máscara de homem sério, ele tinha reencontrado sua infância e reavivado um pouco de sua alegria.
Daquele dia em diante as pessoas viram que ele não era antipático, somente um pouco tímido, e que se ele não falava, não era por grosseria, e sim por medo. Perceberam que a solidão muitas vezes não é uma opção e sim uma condição. Assim como o Lobo percebeu que um sorriso agradável pode abrir muitas portas para perder seu medo e conhecer melhor as pessoas, para deixar de ser sozinho.
E, de repente, o Lobo deixou de ser um Solitário. E passou a ser chamado de Lobo simplesmente porque não era mais um lobinho, mas ainda tinha o espírito de alegria que aquela pequena alcatéia levara.