sexta-feira, 3 de junho de 2011

Greve.

Greve. Greve de fome. Greve geral. Greve que para a cidade toda.
Estou em greve, greve de vida. Se a poesia é a expressão dos sonhos, a prosa é a cópia de nossas vidas. Não posso escrever, assim. Não vivo, apenas existo.
Se há greve ou não, a mim pouco importa, apenas coexisto. Vivo na política do alheamento, sou alheio a tudo em minha volta. Não os incomodo, não me incomodem.
Sou greve. Estou parado há tempos. Não mais vivo, não mais amo. Sou greve, greve de amor.
Mas um dia essa greve haverá de chegar ao fim, basta cederem às minhas reivindicações, e são simples: quero um aumento de cem por cento no amor, na alegria e na amizade. Mas devo admitir, entro em certa contradição, ou em algo paradoxal. Se aumentarmos em cem por cento o zero, em nada chegaremos.

Greve.

A multidão enfurecida se aglomerava em frente da estação. Os portões fechados traziam faixas dizendo que o trem não funcionaria naquele dia. "Estamos em greve".
Eles gritavam, rugiam, mas ninguém dava uma explicação, ninguém estava disposto a agir. Todos só se inflamavam mais e mais. Gritavam, rugiam, quebravam os vidros, o caos estava tomando conta.
Um funcionário, então, apareceu do lado de dentro da estação, protegido pelos portões e correntes.
"Parem logo com essa greve!", "Todos estamos sendo prejudicados", a multidão dizia.
- Bem, nós só queremos um aumento, não é muito, só queremos mais dinheiro e, assim, ninguém sairá prejudicado. Vocês poderão ir ao trabalho tranquilamente e a sociedade continuará nos seus eixos.
Ninguém queria ouvir ninguém, afinal, os dois lados estavam errados e os dois estavam certos, dependendo de que lado você estivesse. A greve não tinha hora para acabar, assim como os civis não pretendiam ir embora. Até que um deles, de repente, como se por uma epifania, parou e sentou-se. Calmamente sentou-se. Os primeiros perceberam como ele destoava do grupo e o questionaram sobre.
"O que você está fazendo?", "Você está bem?" Perguntaram.
- Eu estou em greve. Foi a resposta.
"Greve?!" "Como assim?"
- Estou em greve, não amarei mais.
Eles pararam, ponderaram, e se sentaram.
Enquanto isso, um por um, ao perguntar e receber a resposta do porquê de estarem sentados, sentavam-se também e não falavam nada. Só olhavam para o vazio e o infinito. Até que não sobrou um contra-greve sequer.
Os grevistas perceberam que o caos parara e foram verificar o que aconteceu.
À primeira vista foram cautelosos e tentaram falar com as pessoas que estavam sentadas, mas não receberam nenhuma resposta. Eles saíram e indagaram ao jovem que estava sentado no centro de todos.
- Estou em greve.
- Em greve? Mas nós estamos em greve. Disse um dos grevistas.
- Sim, estão, ninguém poderá trabalhar por vossa culpa. Mas eu estou em greve de amor, não amarei mais.
- Não amará?
- Sim, eu e todos os outros que estamos sentados aqui.
O grevista parou e olhou para a multidão vazia, cheia de falta de amor. Disse para um colega.
- E como continuar vivendo com uma greve dessas?
E sentou-se.