sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O Violinista.

Todos os dias no mesmo horário eu ouvia um violino a ser tocado. Aquelas preciosas notas invadiam minha casa e caíam sobre o papel no qual eu escrevia. De início eu costumava ficar - por falta de melhor palavra - assustado. O violino invadindo-me tão repentinamente, tirando-me do meu tão habitual sossego. Eu me perguntava quem estaria a tocá-lo, seria um rapaz, uma moça? Um músico profissional, um estudante? Por fim eu jamais cheguei a descobrir quem era que trazia aquela música à vida, não que isso tenha sido de suma importância para minha relação com o violino e o violinista, eu segui a amá-los intensamente.
Certa tarde eu estava a escrever e esperava ansiosamente pelo violinista, ouvir suas melodias tão alegres, seus tons tão melancólicos e com isso escrever versos e mais versos, sempre inspirado naquela canção que vinha pelos ares. Mas o tempo passava e nada do meu amigo violinista entrar em ação. Eu esperava por seus pizzicatos, ansiava por talvez um, apenas um, col legno, mas não vinham. Nada de violino, nada de violinista. E o que eu faria sem minha música? De onde tiraria eu a inspiração para meus sonetos? E, assim como tudo se iniciou, chegamos a um fim. Nada de música, nada de violinista.
Desde então, sempre que ouço um violino lembro-me das etéreas tardes que passei a escrever a esse som. Quanto ao problema de não conseguir escrever sem esse fundo, superei-o facilmente, toda vez que tomo a caneta em minhas mãos a sinto como um arco, enquanto as folhas são as cordas e, por fim, musicalmente escrevo.
Hoje eu estou bem, consigo viver sem meu violinista, apesar das saudades, mas mesmo assim, pergunto-me onde ele estará, se alguém o ouve e se esse alguém o sente como eu sentia. Tenho saudades do violinista.

O Violinista.

A corda vibrava melancolicamente. Aquela longa nota aguda que anunciava o início duma nova canção.
Nunca ensaiava, a música era sua expressão, a janela para sua alma, e não existe ensaio para nossos sentimentos. O reflexo de seu coração, era isso que o violino significava-lhe. Ele só queria ser ouvido, queria que alguém - qualquer um - parasse e lhe desse atenção - apenas um segundo! -, só não queria ficar sozinho.
E, em verdade, sozinho não estava, era mui talentoso, com habilidade a sobrar-lhe, indubitavelmente um ás, e cada vez mais aglomeravam-se fãs seus, admiradores da fina e aristocrática música clássica. Mas solitário sim, sempre esteve e tinha plena certeza de que sempre estaria. Rodeado ou não, com um ou cem pessoas a escutá-lo, era solitário, sem alguém para dedicar suas canções.

Um som de piano podia ser ouvido onde sempre estivera o violinista. O violinista podia ser visto onde normalmente algum fã estaria a ver sua performance, geralmente uma bela garota a qual o violinista nunca notara, mas dia após dia estava lá, a sonhar, a criar coragem. A bela garota podia ser observada a tocar a mais bela e melancólica canção que o violinista ou qualquer outro já ouvira.
Agora ele a notava, mas por ser um músico, a conhecia pelo ouvido. Cada nota era um fragmento de sua história, um pedaço condensado de seus sentimentos.
Tirou seu arco, pegou seu violino e tocou uma música semi-alegre, uma tristeza com gosto de esperança. Ela parou por um segundo, fitou-o, sorriu-lhe. Acompanhou o ritmo da música, que cada vez mais alegrava-se. Acelerava, e contagiava - não os espectadores, mas um ao outro.
Alta, barulhenta, ruidosa. Foram perdendo o ritmo, a graciosidade, estavam a gargalhar sem se importar com partituras ou melodias. Pouco a pouco, aqueles que pontualmente reuniam-se para ouvi-lo partiam. Resmungando, praguejando, incomodados com a felicidade e o verdadeiro amor.